À Educação o que é da educação


por Margarida Santos

Se o ensino público constitui o campo da mobilidade social por excelência, mitigando desigualdades várias em função da igualdade de oportunidades no acesso, a educação tem sido também palco das mais diversas políticas governamentais que contrariam a sua função inicial.

Seria de esperar que a condição excecional em que se encontra a maioria da população estudantil - abertura, disponibilidade e fácil acesso a tantos recursos – garantisse a este segmento uma capacidade de reflexão e reivindicação superiores aos restantes. Foi assim em diversos momentos da História recente. Arrisco, no entanto, a afirmar que os lugares de intervenção da população estudantil estão a perder a “ingenuidade” de outrora. Escolas e instituições de ensino superior encontram-se em processo de paulatino esvaziamento da sua função emancipatória, por via das políticas neoliberais que se têm vindo a apoderar dos seus espaços.

A cronologia é, infelizmente, curta. Demasiadamente curta para poder reagir: em meados da primeira década do século XXI introduz-se, em particular no seio do ensino superior, a urgência de integrar, legitimamente, a construção inadiável de um espaço europeu de ensino superior. Fá-lo-íamos através da adesão ao processo de Bolonha, implementando um conjunto de procedimentos administrativos que nos colocariam em igualdade de circunstâncias com a restante população estudantil da União Europeia. As instituições foram então tomadas por um caos processual, que vitimaram desde logo os próprios estudantes. Antes que houvesse a mínima capacidade de contestação, os governos neoliberais europeus impuseram às instituições modelos de gestão totalmente restritivos, designadamente da intervenção estudantil. Sob a capa da famigerada autonomia universitária e da abertura à sociedade civil, instituíram-se atalhos para o grande capital nas universidades.

Estes dois duros golpes abriram as portas à mercantilização dos cursos superiores, ao aumento indiscriminado das propinas e à seleção social dos estudantes.

Semelhante política vai sendo reproduzida na escola pública. A reboque da descredibilização da classe docente, instaurou-se um modelo de gestão autoritário e profundamente burocrático, que delapidou a autonomia dos espaços escolares e destruiu projectos educativos inovadores.
Este conjunto de políticas foi sendo o espelho de um progressivo desinvestimento na Educação no nosso país, que tem um dos mais baixos orçamentos dos países da OCDE.

Neste contexto, urge alterar radicalmente a organização das escolas e das instituições de ensino superior: devolver a estes espaços os mecanismos necessários a que voltem à sua condição emancipatória e progressista, recusando portanto experimentalismos políticos. É necessário dotar os estudantes, os docentes e restante comunidade educativa dos instrumentos necessários à sua participação efectiva nos órgãos de gestão. Reinventar a educação não é possível se não em estreita comunicação com os seus principais actores. É preciso expulsar da escola quem não faz parte da escola e trazer aos seus espaços processos de participação vinculativos e processos eleitorais democráticos.