Avaliações de impacto igualitário


por André Barata

Sugiro que, na base do contrato que nos une como cidadãos, seja instituída a obrigatoriedade de fazer acompanhar a governação económica do país de uma avaliação de impacto igualitário.

Esta obrigação devia ter fundamento constitucional e teria como resultado concreto o escrutínio prévio, por entidade competente (e independente), das Propostas de Lei do Orçamento de Estado, bem como de eventuais Orçamentos Rectificativos, submetendo todas as medidas que afectem a receita e a despesa do Estado a uma avaliação do seu impacto igualitário. Este escrutínio podia ser enquadrado nas funções do Tribunal de Contas, «o órgão supremo de fiscalização da legalidade das despesas públicas e de julgamento das contas que a lei mandar submeter-lhe» (Art.º 214º da CRP). Para isso, as propostas orçamentais deveriam ser presentes ao Parlamento munidas de um estudo de impacto igualitário, previamente fiscalizado pelo Tribunal de Contas, e com menção explícita da previsão da evolução dos indicadores de desigualdade social.

Há uma reflexão simples mas raramente feita sobre qual deva ser o compromisso-âncora da governação económica da República Portuguesa. Tem sido vontade manifesta do Governo, da maioria parlamentar, da troika, do FMI, e da Comissão Europeia a constitucionalização do limite da dívida pública. Seria, portanto, esse o único aspecto não relativizável da governação económica. É estranho este consenso que submete a economia nacional a uma âncora financeira, relativizando assim a própria sociedade e as pessoas que a compõem a esse fim. Mais estranho é quando há evidência constituída de que «more equal societies almost always do better».

Manda o bom senso económico, mandam os fundamentos do contrato social, manda, sobretudo, a profunda desigualdade social em Portugal, que a âncora da economia nacional, o aspecto constitucionalizável portanto, deva ser um compromisso social irrelativizável com os cidadãos: não contribuir para cavar mais fundo o fosso da desigualdade de rendimentos. Não haja dúvidas, o nosso maior défice democrático é um défice chamado desigualdade social.