Finita Causa Cessat Efectus?

por Artur Baptista da Silva 

A União Europeia (U.E.) corre o sério risco de se tornar um embuste civilizacional. 

Na sua constituição foram anunciadas fórmulas paradigmáticas de construção de uma nova filosofia de coexistência supranacional (convivência entre os povos baseada no primado da solidariedade interactiva; uma nova cidadania sem barreiras, consubstanciada numa identidade europeia). 

A realidade actual apresenta-nos uma U.E. que se limita a pouco mais do que dirigir um enorme espaço territorial de comércio livre, prioritariamente ao serviço dos grandes grupos de interesses, não sufragados, em que os direitos individuais e colectivos mais legítimos sofrem atropelos e atentados. 

Os tecnocratas de Bruxelas, sem rosto nem legitimidade, opor-se-ão a um relacionamento democrático dos Estados membros, bem assim como a qualquer projecto inspirado por uma cidadania activa e solidária. Combaterão, sem dar tréguas, a convergência social, económica e financeira : salários, encargos sociais, horários de trabalho, reforma da política fiscal no sentido da sua federalização, a tributação das grandes fortunas, bancos e grupos económicos multinacionais, ou ainda a criação de uma entidade de supervisão bancária europeia. 

A zona euro entrou em ruptura. A Grécia acabará falida e a Espanha e a Itália ( quarta maior dívida mundial), já nas garras dos famigerados “mercados”, estão em zona de risco de insolvência.

A única política imposta pelos governantes europeus resume-se numa palavra : austeridade! 

Desde a crise global dos subprime (2008), causada pela ganância irresponsável dos banqueiros americanos com a conivência activa e cúmplice dos banqueiros europeus, que 28 milhões de novos desempregados se registaram, atingindo já os 50 milhões de pessoas a massa total dos “sem emprego”. 

Esta crise veio acentuar a importância da economia real. A U.E. deverá retomar, sem delongas, a via do reforço da industrialização, sob pena de sucumbir à investida das economias emergentes. 

Só assim vencerá a crise da dívida soberana, dos défices orçamentais e da recessão económica. 

A U.E. representa um mercado de 500 milhões de cidadãos, 20 milhões de empresas e mais de 200 milhões de trabalhadores qualificados. Esta rede económica pode consolidar-se através do engenho e arte dos povos europeus. 

Cultura, arte, conhecimento, clusters tecnológicos, povos com tradições e costumes milenários continuam a constituir uma plataforma determinante e indispensável para o crescimento sustentado da humanidade. 

Para que a U.E. dos povos, no respeito solidário pelas diferenças sociais e idiossincráticas, seja salvaguardada é, pois, indispensável respeitar os valores humanistas que presidiram à sua génese.

Falando, por último, de Portugal é chegado o momento de exigir politicamente as contrapartidas às duras condições impostas ao povo português, no exagero da aplicação de uma terapêutica de cega austeridade que tem acentuado todas as vertentes das patologias macroeconómicas e sociais diagnosticadas. 

É tempo, pois, de os dirigentes europeus, que tanto têm elogiado o reverencial comportamento dos portugueses, sujeitos a situações de carência social, em que até os seus direitos elementares de cidadania têm sido postos em causa, demonstrarem activamente a sua solidariedade, com a assunção de decisões políticas corretoras dos desvios sócio-económicos que vêm destruindo a economia portuguesa, obviando, inclusive, a que todo o processo de resgate venha a ser posto em causa!