Os problemas estruturais da economia portuguesa e as repostas necessárias


por Ricardo Paes Mamede

O Memorando de Entendimento assume que os desequilíbrios macroeconómicos em Portugal resultam de comportamentos errados do Estado, das famílias e das empresas. “Andámos a viver acima das nossas possibilidades”, dizem-nos. Este discurso populista subvaloriza o papel das fragilidades estruturais da economia portuguesa no desempenho medíocre da nossa economia.

Há três fragilidades que estão na base desse fraco desempenho: a muito baixa qualificação da população activa, o perfil de especialização da economia (assente em sectores de baixo valor acrescentado e reduzidas perspectivas de crescimento) e a posição periférica da economia portuguesa face aos principais mercados internacionais.

Os acordos comerciais realizados pela UE com as grandes economias emergentes e o alargamento da UE a Leste vieram acentuar as consequências daquelas três fragilidades: o mercado europeu foi inundado de produtos que concorrem com as exportações portuguesas (com custos de produção muito mais reduzidos); as baixas qualificações da população dificultam uma transformação estrutural da economia que evite essa concorrência directa; e a posição geográfica desfavorável acentua a desvantagem de custos nos mercados internacionais.

A resposta do Memorando a estas dificuldades consiste em forçar a desvalorização dos salários em Portugal. Esta estratégia pode beneficiar algumas exportações e reduz as importações (pela queda abrupta do poder de compra), mas não resolve nenhum dos três problemas acima referidos. Pior, a estratégia da austeridade dificulta a resolução dos problemas estruturais da economia portuguesa: reduz os esforços de qualificação de jovens e de adultos; leva ao adiamento de investimentos em inovação empresarial e em soluções logísticas que melhorem a conectividade internacional de Portugal; e, levando ao limite as privatizações, retira ao Estado português a possibilidade de influenciar as decisões estratégicas das empresas com maior poder de arrastamento do tecido produtivo nacional.

A resolução sustentada dos problemas estruturais da economia portuguesa exigem:

- um plano nacional de combate ao abandono e ao insucesso escolar e o prosseguimento dos esforços de formação e qualificação de activos adultos;

- a gestão directa, integrada e transparente por parte do Estado das infraestruturas transportes e de logística;

- a implementação  de uma estratégia integrada, coerente e transparente de apoio à inovação e à transformação estrutural da economia;

- a criação de um banco público de fomento, que assegure, de forma coerente e transparente, o financiamento dos investimentos indispensáveis ao desenvolvimento da economia portuguesa;

- o controlo pelo Estado de grandes empresas com maior poder de arrastamento da economia portuguesa em termos de desenvolvimento tecnológico.